quarta-feira, 12 de junho de 2013

Presentão


- Arruma o chuveiro que eu já fico feliz – disse ela, crente que colocava fim ao meu martírio em busca de um presente de Dia dos Namorados.

De fato, temos um problema que se arrasta já há alguns meses. Tornou-se comum ela ser surpreendida por um jato d’água gelada, certeiramente dirigido às suas costas, um pouco abaixo da nuca, assim que o chuveiro atinge a temperatura ideal. Situação que tende a se agravar com a chegada do inverno. Ela forçará mais o chuveiro e ele responderá com mais água gelada.

Mas, eu me recusava a “dar um jeito no chuveiro” como um presente do Dia dos Namorados. Até porque – e principalmente porque – eu não sei dar um jeito no chuveiro.

- Esse chuveiro tá bom, amor. O que você quer que eu faça?

- Quero que ele não desligue mais no meio do meu banho.

- Posso fazer isso mais pra frente? Aí, agora, te dou um presente mais normal.

- Não quero. Você vai perder tempo e dinheiro comprando o presente mais normal e, depois, não vai conseguir arrumar o chuveiro.

- O problema é que tá muito em cima. Não dá tempo de chamar um eletricista.

Pelo olhar dela, entendi tudo. Algo como “Eu estou te pedindo isso desde o fim do inverno passado”.

Eu precisava mudar de estratégia.

- Da última vez que o eletricista veio aqui, disse que a fiação do apartamento não aguenta chuveiro mais potente que esse. Teria que trocar toda a fiação.

Mantendo o mesmo olhar, ela inclinou um pouco a cabeça para o lado direito, expressão que eu já tinha cadastrado como um silencioso “te vira”.

Papel e caneta nas mãos, fingi que estava anotando e comecei meu monólogo: “trocar fiação, chuveiro novo, mais a mão de obra. Amor, isso vai ficar caro”.

Dessa vez, ela preferiu abaixar a cabeça e responder calmamente.

“Conversa com o proprietário e pede pra ele abater no preço do aluguel”

Eu precisava mudar de tática mesmo, a coisa estava ficando cada vez mais complexa: eletricista, orçamento, fiação, chuveiro, e-mail para o proprietário, resposta do proprietário solicitando outro orçamento...

- Você não acha isso pouco romântico?

- Pouco romântico é receber quase um choque elétrico toda vez que o chuveiro vai ficando quentinho. Você não sabe do que eu te xingo quando isso acontece... Nada romântico.

- Não quer um vestido?

- Não

- Livro

- Não

- Perfume

- Pode ser. Se não arrumar o chuveiro, dá um perfume, porque vou parar de tomar banho.

- Amor... – em tom choroso.

- Que foi?

Pausa dramática. Respirada dramática. Reflexão dramática.

- Acho que não vai dar tempo.

Olhar severo, cabeça inclinada pra direita: “te vira”.

O mesmo eletricista que disse que precisaríamos trocar toda a fiação da casa, dessa vez, foi mais camarada.

- Que nada. O problema aqui é que a água tá descendo com muita pressão. A gente coloca um redutor de pressão e tá tudo certo.

Ensaio uma comemoração.

- Só que não tenho o redutor aqui (...)

Putz.

- (...) Tá no carro...

Ufa...

- (...) que tá na oficina. Mas, amanhã, consigo arrumar isso pra ti.

Esse amanhã, que era pra ser semana passada, será hoje. Espero, pelo menos.

Ele acabou de ligar, disse que acaba um serviço às 18h e passa aqui.

Contagem regressiva.

Até meia-noite ainda é Dia dos Namorados, mas, por via das dúvidas, só pra garantir, assim como quem não quer nada, dei um jeito de perguntar que perfume ela queria.

PS.: Se você achou um absurdo eu não saber colocar um simples redutor de pressão no chuveiro, leia isso aqui.